terça-feira

Balada dos Caranguejos Sem Cérebro

Desde que me entendo por gente, sempre curti as variadas formas de alteração e expansão da consciência, se é que me entendem e sempre tive enorme apreço pela fuleragem, maresia, sacanagem e regalias, obviamente. Longe de querer estereotipar um tipo de evento e reconhecer que muita gente amiga e interessante é amante das festas raves, preciso externar certas impressões que obtive frequentando algumas dessas baladas contemporâneas.


Ciente de que corro o risco de ser acusada de estar generalizando e legitimando um preconceito, antecipo que se trata de uma opinião íntima e pessoal, do tipo: "se gostou, bate palma" / "se não gostou, feche o blog".

Primeiramente, constatei estar entre uma juventude obcecada pelo corpo perfeito. Estava diante da mais perfeita expressão coletiva do culto aos padrões normóticos do ser que não almeja ser, mas aparentar. Pessoas que viram caricaturas de si mesmas, pois pensam incessantemente em malhar, ficar saradona/ão, trabalhar braços, pernas, glúteos, tríceps, que poderiam muito bem andar como quadrúpedes, pois estariam bem adaptados fisicamente. Não me atrevo a criticar os aspectos ligados ao auto-cuidado, da busca por um corpo saudável, mas sim analisar o quanto a preocupação estética atinge as mentes ululantes amantes da saração.

É evidente que ao encontrar uma multidão ajustada à um modelo de corpo nota-se o quanto são dependentes do culto aos espelhos, com veias contaminadas pelo vírus da escravidão da beleza. Ora, se o que nos humaniza é nos reconhecermos não só na beleza, mas também na tragédia e em nossas diferenças, como posso admirar um coletivo que exibe corpos iguais esculpidos no modelo "máquinas perfeitas"?

Esteticamente iguais, os caranguejos sem cérebro (parte da turma amante das raves) também são adeptos das caras e gritantes marcas, com letras garrafais estampadas em bonés, óculos, camisetas, blusas e bermudas, roupas esportivas que custam quase um salário de um trabalhador, exibem-se triunfantes Billabong, QuickSilver, Oakley, entre outras marcas de alto valor monetário. Ciclanos, beltranxs e fulanxs ofuscam o que há de mais lindo na humanidade: a diversidade e singularidade.O lance é estar "top", estar no padrão.

Na busca de um corpo perfeito esculpido à custa de malhações e enxertos de anabolizantes, o clube dos corpos televisivos se vê dentro de uma jaula chamada narcisismo. O narcisista ama o que lhes é parecido. O narcisista dança e se exibe, sem a pretensão de interagir com outrxs que não sejam do seu clube. E nessa balada da multidão solitária, você é o que veste, você é o que tem. E se você aparenta estar gostosx e bem na fita com as peças mais caras do mundo xovem e rico, você será bastante popular.

Vale tudo pra entrar nos conformes corpóreos e estéticos dessa tribo, que nada se assemelha aquela dos anos 60, que suava em meio ao lamaçal, rejeitava qualquer padrão imposto ou repressão moral. Eram também praticantes de amores libertários e da liberação do corpo e mente para vivenciar formas autênticas e potentes de vida. Hoje, posso constatar que xs jovens nem almejam as formas libertárias de viver e de amar e se encontram mais presos na cela do consumismo. Cada vez mais presxs nas caixinhas da vida...

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